sexta-feira, novembro 25, 2005

Tua

Deixa-me beber as tuas lágrimas, amor.
Deixa-me ser o teu sofrer
O teu sangue sujo de um medo abstracto.
Deixa-me comer a tua fome
E ser o teu peito
Ferido de um amor perdido.

Toco suavemente no teu rosto
Fazendo-te acreditar que sou tua.
Inteiramente tua.
Acaricio esse sorriso tímido
E beijo esse olhar entristecido.

E quando a morte chegar,
Deixa-me ser o teu corpo
A tua alma, a tua voz.
Descansa, meu amor,
Que jamais hás-de partir.

Estou aqui,
Não te vou deixar conhecer
O desconhecido.
Amo-te e, assim,
Estás protegido.

sábado, novembro 19, 2005

Partida, sem dor

Não estás, mas eu olho-te
Quero sentir-te cá dentro
Viajar em ti
E mergulhar-te dentro de mim

Continuas sem estar presente,
Mas eu beijo-te.
Quero calar esta sede
Com o prazer de te ter

O tempo passa
E deixa a cicatriz de uma dor que,
Um dia, foi tão profunda.

Já não te espero,
Mas ainda te desejo.
Quero sentir o teu cheiro;
O prazer dos teus lábios
molhados de um amor, que eu sei
que não é o meu.

Gosto de ti,
Mas podes ir
Que eu não te vou esquecer!

terça-feira, novembro 15, 2005

Desespero

Assusta-a olhar para si e ver naquilo em que se está a tornar. Perfeccionista em demasia; obcecada em atingir a meta proposta. Olha-se ao espelho e depara-se com um exterior cansado, que liberta compulsivamente lágrimas de um sofrimento que vai aumentando dia após dia. Esse derrame de lágrimas é a prova que ainda se mantém viva, mesmo que por dentro se encontre morta. Está cansada! Cansada da vidinha perfeita e responsável que leva. Cansada das horas que não dorme, dos problemas que a atormentam e do medo que tem em não conseguir alcançar o sonho por que tem trabalho anos e anos. Cansada dos sacrifícios que faz, porque assim acha que tem que ser. E tem mesmo que ser.
Cansada.
As lágrimas continuam a cair e, aos poucos, vão-lhe corroendo o rosto. Já nem as olheiras consegue disfarçar. Profundas e quase negras. Não quer desistir, mas, de momento, o que mais quer é parar de sofrer. Anseia pelo dia que alguma coisa lhe seja entregue sem, por isso, ter que se matar a trabalhar arduamente. Nada lhe corre bem. E tem consciência de que a sua obsessão por ser perfeita - que acaba sempre por não o ser - está a levá-la ao extremo, ao máximo que qualquer ser humano consegue aguentar.

Mesmo que ainda haja uma força - não sabendo ela de onde possa vir - que a faz caminhar, ela pára. Odeia-se. Não quer continuar a sofrer desesperadamente para que um dia - futuramente - possa ser feliz, até porque, esse dia pode nunca chegar. E do que lhe valeu tanto esforço e dedicação? O que valeu deixar de sorrir, de cantar, de representar, de amar para ter talvez um dia de felicidade? Para quê abdicar tanto?

Desiste. E, se já se encontrava quase morta, agora encontra-se definitivamente enterrada.

domingo, novembro 13, 2005

Sem nada

Cruelmente,
bebes as minhas lágrimas
que choram por ti
que te anseiam
e que pedem,
para que voltes para mim

Devolves-me os beijos
que trocámos,
os abraços, apertados,
que me faziam achar
que eu era tão tua
Só tua.

Tiras o calor do meu corpo, misturado com o teu,
arrancas-me, ingenuamente, o sorriso com que nasci
tiras-me a alma afortunada
e o mundo,
onde fui tão feliz

Deixas-me aqui
só e desgraçadamente destruída
de coração negro
e sem a riqueza de um amor
que me acaba de fugir

quarta-feira, novembro 09, 2005

Obra do amor

Deixo que me moldas ao teu gosto. Que percorras essas tuas mãos fortes e imperativas pelo meu corpo, deixando que eu seja a tua mais bela criação. Olho-me como se fosse a primeira vez. Descubro-me. Sinto-me bela por ter sido criada por ti.
Olhamo-nos como se fossemos um só e navegamos juntos no corpo dum do outro, até que o ar que paira à nossa volta nos separe e tenhamos que, uma vez mais, partir em caminhos que dificilmente se cruzarão...

sábado, novembro 05, 2005

Desejo inconsciente

Aproximamo-nos da tua casa e eu sinto-me deslocada deste corpo, como se não fosse o meu. Paro, mas tu puxas-me de imediato e continuamos, então, a caminhar naquela rua escura e deserta. A noite foi longa. Dançámos imenso. Alimentámo-nos dos nossos risos e dos nossos beijos. Sinto-me sem forças. Deixo-me cair na tua cama, e tu usas o meu corpo como se fosse o teu, e eu deixo-me levar por essa tua loucura inata.

Acordo forçosamente com a luz do sol. Espreguiço-me. Olho em volta e encontro-te a meu lado. Não acredito que aquele cenário seja verdadeiro. Fecho os olhos e volto a abri-los, olho em volta e tu continuas lá. Levanto-me apressadamente e percorro em busca da minha roupa que se encontra espalhada naquele quarto enorme. Visto-me tão rapidamente que a camisola fica do avesso. Não tenho tempo para a mudar. Procuro a saída da tua casa, pois não me lembro por onde entrei. Desisto de a procurar. Sento-me no chão da tua sala ainda por mobilar. Penso porque é que quero fugir de ti, se sempre te quis ter junto de mim. Sorrio timidamente e volto para o teu quarto, onde tu ainda dormes. Dispo-me e espalho a roupa, como estava inicialmente. Deito-me cuidadosamente na tua cama, e abraço-te fortemente para que não consiga fugir mais nenhuma vez de ti. Os meus olhos sorriem e eu volto adormecer.



Outubro 22, 2005