terça-feira, julho 06, 2004

Num banco de jardim

Acordei. Tu não estavas, até porque, nunca estiveste. Estava só. Completamente só. Espreguicei-me e sorri, e por meros instantes fiquei assim, a sorrir. Estava feliz. Feliz? Sim, feliz. Vesti-me num minuto, mas fiquei horas a olhar para o espalho, horas a sonhar acordada. De repente “acordo”, e assusto-me com a minha própria figura. Olho pela última vez para aquele objecto que transmite uma imagem, a minha imagem. Dou os últimos retoques, pego na mala, abro a porta e depois fecho-a.
Tudo igual, nada mudou. A mesma correria, os mesmos olhares cansados e por vezes rancorosos. Vou andando. Ando. Ando. E tantas são as acções de egoísmo, que os meus próprios olhos vêem. Não posso crer, mas é verdade. Desiludo-me e arrependo-me de ter saído de casa, da minha casa, do meu mundo, do mundo onde ainda se sonha, do mundo onde ainda se é feliz. Quase que choro. Viro a cara e um “outro mundo” eu encontro, “o mundo das crianças”, é sem dúvida o mundo mais puro, mais alegre, um mundo onde a imaginação, amizade e a solidariedade reinam. Fico feliz. Mas logo dá-me um arrepio enorme, quando penso que eles também crescem e, certamente, irão passar pela mesma correria, irão ter os mesmos olhares cansados e por vezes rancorosos, irão tomar actos de egoísmo. Fico parada a tentar perceber como é possível tantos sorrisos se transformarem em lágrimas de ódio. Não percebo. De facto, não quero perceber. Tento esquecer. Não consigo. Volto a tentar. Esqueço. Continuo andar. Ando. Ando. Até que, num banco de jardim, lá estava ele. Quem? Não sei. Mas era ele quem eu sempre procurara. Não o conheço. Mas sei que era ele. Jovem, pouco mais de 20 anos. Bonito e com um sorriso de criança que me fez sorrir, olhos doces, os dele. Voltei a ficar feliz e quando dei por mim, lá estava ele fixado em mim. Ficamos assim. Olhos nos olhos sem nada dizer. Não era preciso. Tudo dissemos com um simples olhar. Até que nos aproximamos e aí sim, falamos, falamos muito, falamos até ao anoitecer. Vimos o pôr-do-sol e nem se quer reparamos. Tudo parecera um sonho, afinal tinha acabado de o conhecer mas a sensação não era essa. Conhecera-o desde sempre. E ele a mim. Fomos para casa. E….
Acordei. Tu estavas, até porque, sempre estiveste. Não estava só. De jeito nenhum. Espreguicei-me e sorri, e por meros instantes fiquei assim, a sorrir. Estava feliz. Feliz? Sim, feliz.